VOZ DO LOGOS: REFLEXÃO/HOMILIA PARA O IV DOMINGO DA PÁSCOA – ANO C (DOMINGO DO BOM PASTOR / DOMINGO DAS VOCAÇÕES)

A Autoridade do Bispo de Roma e a Necessidade de Sabermos Escutar

Primeira Leitura: Atos 13,14.43-52
Salmo Responsorial: Sl 99(100),1-3.5
Segunda Leitura: Apocalipse 7,9.14-17
Evangelho: João 10,27-30

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Rosary - POPE LEO XIV The Vatican's Holy See has unveiled the official  portrait of Pope Leo XIV, our 267th supreme pontiff. 📷Holy See | FacebookA eleição do Papa Leão XIV acontece num momento em que a Igreja, ainda que sempre guiada pelo Espírito Santo, enfrenta mares agitados. Muitos membros do clero e do povo fiel têm sido arrastados para discursos polarizados sobre doutrina, liturgia e condução pastoral. As redes sociais, os encontros nas paróquias e até mesmo os ambientes acadêmicos de teologia não têm escapado dessa tensão. Nesse cenário, a escolha de um novo papa representa, ao mesmo tempo, um chamado à renovação e um desafio à fidelidade. Em momentos assim, somos lembrados de que o papado não é questão de popularidade ou política, mas de instituição divina. Cristo fundou sua Igreja sobre a rocha que é Pedro, e por meio da sucessão apostólica, este ofício petrino continua a ser fonte e sinal visível de unidade (cf. Lumen Gentium, 23). Escutar o Bispo de Roma, o sucessor de Pedro, é permanecer dentro da Tradição viva da Igreja. E isso não se reduz a uma escuta passiva, mas requer uma atitude de atenção e obediência. A palavra grega akouō (ἀκούω), que significa “ouvir”, traz consigo essa nuance mais profunda — trata-se de uma escuta que impulsiona à ação, ou seja, à obediência. Nas Escrituras Hebraicas, o termo equivalente shamaʿ (שָׁמַע) também implica tanto ouvir quanto obedecer. Assim, a nossa saúde espiritual depende não apenas da mensagem proclamada, mas da disposição em escutar a Cristo, o Bom Pastor, no magistério autêntico da Igreja, especialmente no ofício papal e nos bispos em comunhão com ele, conformando nossas vidas à mensagem evangélica.

A Primeira Leitura, tirada de Atos 13,14.43-52, nos apresenta Paulo e Barnabé na sinagoga de Antioquia da Pisídia, proclamando com ousadia o Evangelho. O Sitz im Leben (contexto vital) dessa perícope é o de uma comunidade pós-ressurreição lidando com as consequências explosivas da universalidade da Boa-Nova. Aquilo que outrora era uma mensagem da aliança exclusiva para Israel agora se estende a todos os povos (cf. Is 49,6, citado diretamente por Paulo no v.47). A proclamação da salvação em Cristo provoca reações diversas: enquanto alguns a acolhem com alegria, outros, tomados de inveja, a rejeitam. O que importa é que Paulo e Barnabé agem com autoridade apostólica; não são aventureiros independentes, mas enviados (apostellō) sob a autoridade de Cristo e em comunhão com a Igreja de Jerusalém (cf. At 13,3). O texto observa que muitos “foram persuadidos a perseverar na graça de Deus” (At 13,43), o que implica que escutaram, e não apenas ouviram o ensinamento apostólico. Outros, porém, adotaram uma escuta seletiva, movidos por interesses próprios e orgulho cultural. Essa mesma dinâmica se mantém hoje, quando alguns escolhem apenas certas partes do magistério papal para seguir. Assim como Paulo e Barnabé se voltaram aos gentios, reafirmando a universalidade do Evangelho, também a Igreja nos recorda que a fidelidade à voz apostólica é o único caminho autêntico para a plena comunhão. O Bispo de Roma, como sucessor de Pedro, continua essa proclamação apostólica, não por mérito pessoal, mas por instituição divina de Cristo (cf. Lumen Gentium, 22).

O Salmo Responsorial 99 aprofunda nosso tema com clareza poética. Ele convida toda a terra a servir o Senhor com alegria, a reconhecê-lo como Deus e a afirmar que “somos o seu povo, o rebanho que Ele conduz”. A imagem do rebanho evoca a relação de pastoreio que está no centro da espiritualidade bíblica. Está em segundo plano aqui a antiga memória de Deus conduzindo Israel, não como uma força distante, mas como um pastor atencioso (cf. Sl 23; Ez 34). “Saber” que o Senhor é Deus (Sl 99,3) não significa apenas reconhecê-lo intelectualmente, mas acolher sua voz e submeter-se à sua orientação. No sentido joanino, conhecer é estar em relação (cf. Jo 10,14). Essa postura de escuta torna-se fundamental para discernirmos qual voz carrega peso divino na vida da Igreja. O tema do pastor encontra sua expressão máxima em Cristo, mas se estende àqueles a quem Ele confiou sua autoridade (cf. Jo 21,15–17). Este salmo, situado no contexto da liturgia de Israel, fala também ao nosso contexto litúrgico atual: servir ao Senhor com alegria é fazê-lo dentro da ordem eclesial, e não segundo espiritualidades isoladas. Conforme ensina Lumen Gentium, o papa, juntamente com os bispos em comunhão com ele, é a fonte e o fundamento visível da unidade (LG 23). Recusar-se a escutar não é, portanto, apenas uma falha pastoral, mas uma ruptura teológica com a estrutura visível que Cristo quis para sua Igreja.

É dentro desse contexto de escuta e obediência eclesial que o Evangelho de João 10,27-30 coroa nossa reflexão, fundamentando-a nas próprias palavras de Cristo: “As minhas ovelhas escutam a minha voz; eu as conheço e elas me seguem.” O Sitz im Leben deste trecho é a tensão crescente entre Jesus e as autoridades judaicas durante a Festa da Dedicação em Jerusalém. Jesus declara: “As minhas ovelhas escutam a minha voz.” A palavra grega utilizada aqui é novamente akouō (ἀκούω). Ela mostra que o ato de escutar não é passivo, mas relacional: é um gesto de reconhecimento da aliança entre pastor e ovelhas. Jesus revela que essa relação é indestrutível, pois ninguém pode arrancá-las de sua mão. Esta afirmação é essencial para compreendermos a autoridade do magistério da Igreja. A voz do pastor continua a se fazer ouvir hoje nos sucessores dos apóstolos, especialmente no Bispo de Roma, que possui o munus docendi – ou seja, a missão do ensino autêntico. De acordo com Lumen Gentium 25, quando o papa proclama doutrina de fé ou de moral ex cathedra, ele o faz de modo infalível com a assistência do Espírito Santo. Mesmo quando não fala de forma infalível, seu ensinamento ordinário requer acolhimento religioso da inteligência e da vontade. Em tempos em que interpretações pessoais ameaçam a coerência eclesial, a voz do Bom Pastor, manifestada nos ensinamentos do Papa, torna-se nossa salvaguarda. Em termos práticos, isso levanta perguntas desconfortáveis, porém necessárias: podemos de fato dizer que seguimos Cristo se ignoramos os ensinamentos e orientações daquele que Ele designou para confirmar os irmãos? A cacofonia de dissensos atual, inclusive entre membros do clero, revela uma crise mais profunda de akouō, uma recusa de escutar de modo transformador. Tal recusa rompe a comunhão e gera confusão espiritual.

Diante disso, a segunda leitura, de Apocalipse 7,9.14b-17, não oferece uma imagem desconectada, mas sim o cumprimento da verdadeira identidade da Igreja — “uma multidão imensa, de todas as nações… de pé diante do trono e do Cordeiro.” São aqueles que saíram da grande tribulação e agora vivem sob o cuidado do Cordeiro Pastor, que os conduz às fontes de água viva. Esta visão apocalíptica nos mostra que o destino da Igreja não é o caos nem a divisão, mas a unidade sob o pastoreio divino. A palavra grega poimainei (ποιμαίνει), usada no v.17 para “os apascentará”, também aparece em João 21,16 e 1 Pedro 5,2, mostrando que o Cristo ressuscitado continua seu cuidado pastoral por meio da mediação apostólica. A cena do Apocalipse não está distante da Igreja presente; ela é a sua imagem cumprida — uma Igreja purificada, unificada e conduzida até sua plenitude. Enquanto isso, a Igreja vive sacramentalmente e visivelmente essa unidade por meio da comunhão com o Papa. Sem essa comunhão, a visão do Apocalipse se torna apenas uma aspiração. Na prática, caminhar rumo à Jerusalém celeste exige dos católicos o resgate da confiança eclesial, mesmo quando decisões vindas de Roma desafiam nossas expectativas ou nossos quadros culturais. O Papa Leão XIV se apresenta agora não apenas como mais um sucessor, mas como um sinal concreto de que o ministério de Pedro continua sendo necessário para que a Igreja enfrente com firmeza os ventos da história. Escutá-lo é caminhar com mais segurança rumo ao Cordeiro que guia do trono.

Diante dessas leituras e da graça do momento atual da Igreja, somos chamados a reacender nossa confiança na guia divina do ofício petrino. O Papa Leão XIV assume essa missão não como um teólogo particular, mas como Pedro entre nós, chamado a confirmar os irmãos (cf. Lc 22,32) e a fortalecer os fiéis na verdade e na caridade. Portanto, a fidelidade ao Papa não é um sentimento, mas uma postura teológica fundamentada na continuidade apostólica. Além disso, escutar verdadeiramente requer humildade para acolher ensinamentos que nos desafiam, ao invés de buscar mestres que apenas confirmem nossos preconceitos (cf. 2Tm 4,3). Devemos cultivar uma espiritualidade que compreenda a obediência eclesial não como servilismo, mas como confiança no desígnio do Pastor. Num tempo em que muitos afirmam falar em nome de Cristo, lembramos que sua voz se torna mais clara na unidade da Igreja, guiada por Pedro e seus sucessores.

Com alegria no coração, felicito o novo Santo Padre, o Papa Leão XIV. Sua aceitação do ministério petrino em um tempo tão delicado da vida da Igreja é, ao mesmo tempo, corajosa e providencial. Asseguro-lhe minhas orações diárias, para que sua voz continue sendo eco da voz do Bom Pastor, conduzindo o rebanho com clareza, sabedoria e amor. Que os fiéis, os padres e os bispos aprendam novamente a escutar — não como ouvintes passivos, mas como participantes da obediência da fé que edifica o Corpo na unidade e na verdade. Em meio a uma era inundada de vozes, que saibamos sintonizar nossos ouvidos com a única Voz que reúne, ensina, santifica e governa a Igreja do Deus vivo.

Robert Francis Prevost: 5 Things About the New Pope Leo XIV – Hollywood Life

Oxalá ouvísseis hoje a sua VOZ: não fecheis os vossos corações! (Sl 95,7)


Shalom!
© Pe. Chinaka Justin Mbaeri, OSJ
Seminário Padre Pedro Magnone, São Paulo, Brasil.
📧 nozickcjoe@gmail.com / fadacjay@gmail.com


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Chinaka Justin Mbaeri

A staunch Roman Catholic and an Apologist of the Christian faith. More about him here.

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