Estamos Crescendo em Número ou Crescendo em Cristo?
Primeira Leitura: Atos 15,1-6
Salmo Responsorial: Sl 121(122),1-5
Evangelho: João 15,1-8
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Imagine entrar em uma comunidade paroquial vibrante. O coral canta lindamente, a liturgia transcorre com precisão, a homilia é inspiradora, há ofertas e inúmeros agradecimentos, muitos se alinham para receber a Eucaristia, os uniformes estão impecáveis, os fiéis são numerosos e o calendário está repleto de atividades. Mas, ao olhar mais de perto, você percebe que algo está faltando. As pessoas não se falam após a Missa. As reuniões terminam em discussões. Há fofocas nos bastidores, inveja entre os líderes e uma disputa por visibilidade em vez de serviço. Surge a pergunta: onde estão os frutos? Não os frutos de uma agenda lotada ou de grandes números, mas os frutos de vidas transformadas, corações reconciliados, paz cultivada e alegria sustentada. É aí que as leituras litúrgicas de hoje nos atingem diretamente. A questão não é atividade, mas autenticidade. E a palavra grega “καρπός” (karpós), que significa “fruto”, se coloca diante de nós como um espelho. Não qualquer fruto, mas aquele que comprova que estamos conectados a Cristo, a videira verdadeira.
Começando com a primeira leitura (Atos 15,1-6), encontramos uma comunidade em crise; somos levados à tensão da Igreja primitiva. Alguns cristãos judeus vindos da Judeia ensinavam que os convertidos gentios precisavam ser circuncidados conforme o costume de Moisés para serem salvos. Não se tratava de um simples debate ritual. Era uma crise eclesial profunda sobre identidade e salvação. Quem faz verdadeiramente parte do Povo de Deus? O que define quem “pertence”? O Sitz im Leben, ou o contexto de vida desse trecho, é uma Igreja diante de uma transição cultural intensa. As antigas fronteiras da Lei estão colidindo com a abertura radical do Evangelho. Paulo e Barnabé já haviam testemunhado os frutos entre os gentios: conversões, recepção do Espírito, sinais e maravilhas. Mesmo assim, alguns ainda queriam medir a pertença por marcas externas. E é aí que “καρπός” (fruto) paira silenciosamente sobre o debate. O que significa ser um cristão frutífero? A fidelidade a Cristo exige a adesão a todos os costumes da antiga aliança? O que está em jogo é a identidade da Igreja. Aqui, Paulo e Barnabé não estão defendendo o relaxamento moral, mas insistindo que o verdadeiro critério de pertença a Cristo não é a observância ritual, mas os frutos visíveis: vidas transformadas, conversões genuínas e a presença do Espírito Santo entre os fiéis gentios. Em resumo, é possível ser muito religioso e ainda assim infecundo; manter tradições e, ao mesmo tempo, resistir à graça. Esse é o ponto controverso: quando as estruturas humanas começam a definir a fé mais do que a ação do Deus vivo. A credibilidade da Igreja, ainda hoje, depende não das suas formas, mas da sua fecundidade. Somos uma Igreja de aparências ou de substância?
O Salmo responsorial 121(122) nos oferece outra camada do mesmo tema. O salmista exulta com o convite de entrar na casa do Senhor: “E agora nossos pés já se detêm, Jerusalém, em tuas portas.” Aqui, o fruto toma a forma de comunhão. Jerusalém não é apenas uma cidade; é uma realidade espiritual, símbolo de unidade, culto e justiça. As tribos sobem para dar graças ao Senhor, onde estão os tronos de julgamento. Isso não é mera nostalgia por um lugar sagrado. O Sitz im Leben desse Salmo reflete um povo peregrino celebrando o centro da vida da aliança. E o fruto é visível na harmonia das tribos reunidas como um só corpo. Nesse contexto, “καρπός” se manifesta nos relacionamentos, na justiça, no culto fiel. Em nossas paróquias hoje, construímos programas, formamos comissões, criamos páginas nas redes sociais e ornamentamos os presbitérios, mas se nosso culto não se traduz em justiça, se nossos encontros não restauram os vínculos quebrados, então estamos em Jerusalém fisicamente, mas fora do seu espírito. Uma igreja que gera barulho, mas não reconciliação, é como uma videira cheia de folhas, mas sem uvas.
O Evangelho de João 15,1-8 leva o tema ao seu auge. Jesus fala no cenáculo, nos momentos finais antes de sua Paixão. O Sitz im Leben é íntimo, sério e profundamente teológico. Ele diz: “Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o agricultor… Quem permanece em mim e eu nele, esse dá muito fruto.” O verbo grego usado repetidamente é μένω (menō), que significa permanecer, ficar, habitar. O fruto (καρπός) depende inteiramente dessa permanência. Sem conexão, não há fruto. Sem relacionamento, não há vida. O escândalo do nosso tempo é que muitos invocam o nome de Cristo sem viver em comunhão com Ele. Há barulho sem profundidade, ministério sem oração, aparência sem vida interior. Jesus adverte que os ramos que não dão fruto são cortados e lançados ao fogo. Isso não é crueldade divina. É o reflexo de uma realidade espiritual. Sem permanecer n’Ele, até o católico mais ativo se torna madeira seca. E a palavra-chave é “muito” fruto, não apenas folhas. Ele ainda diz que o Pai poda todo ramo frutífero para que produza mais fruto. Podar os ramos pode deixar a planta com aparência desnuda, já que até partes saudáveis são removidas. É, frequentemente, uma experiência dolorosa para a planta. Rompe com a aparência natural, gerando uma sensação temporária de dano ou retrocesso. No entanto, esse corte direcionado canaliza a energia para as raízes e galhos, promovendo um crescimento mais forte e robusto. Em outras palavras, o sofrimento, a correção e a renúncia fazem parte da fecundidade. Evitá-los nos deixa cheios de folhas, mas estéreis. Aceitá-los nos faz crescer.
Queridos irmãos e irmãs em Cristo, essa reflexão convida cada paróquia, comunidade e indivíduo a avaliar não o quão cheias estão suas igrejas e agendas, mas o quão cheia está sua vida com frutos visíveis. As pessoas encontram paz, paciência, bondade, humildade e amor através da nossa presença? Se não, somos ramos pendurados sem conexão. Devemos perguntar: estou permanecendo em Cristo diariamente por meio da oração, da Escritura, dos Sacramentos e da obediência, ou apenas estou cumprindo obrigações religiosas por aparência? No nível comunitário, frutificar significa criar ambientes onde a reconciliação é possível, onde os pobres são vistos e ouvidos, onde a verdade é dita com caridade e onde a liderança nasce do serviço, não da ambição. Um ministério que não gera esses frutos não é frutífero, mesmo que seja popular nas redes sociais.
Além disso, devemos aprender a discernir fruto em vez de espetáculo. Só porque alguém reza em voz alta ou cita as Escrituras com fluência, não significa que está permanecendo na Videira. O que importa é seu caráter, sua perseverança no sofrimento e seu amor nas coisas ocultas. Pastores e líderes precisam aprender a podar o que é folhoso, mas não frutífero. Isso pode significar repensar o foco, redistribuir tarefas ou chamar as pessoas de volta à fonte. Os fiéis também precisam parar de idolatrar a aparência e começar a buscar a substância. Você vê fruto nas suas confissões? Na sua vida familiar? Em como você trata as pessoas difíceis na igreja ou em casa? A presença do fruto não se mede por aplausos, mas por mudanças duradouras.
Como cristãos, precisamos nos submeter à poda. A poda frequentemente se parece com perda; ou seja, cortar aquilo ao qual nos apegamos, mesmo que já não dê vida. Ela nos obriga a encarar nossos limites, a entregar o controle e a aceitar tempos de silêncio e obscuridade. No entanto, é justamente nesse desconforto que Deus prepara raízes mais profundas e frutos mais duradouros.
Por isso, somos chamados a reavaliar nossos critérios. O mundo mede o sucesso por números, tamanho, popularidade e visibilidade. Mas Deus mede pelo “καρπός”: na transformação escondida, na fé perseverante, na obediência silenciosa. Uma freira moribunda num convento pode dar mais fruto para a Igreja do que um pregador famoso na internet. Uma mãe que educa seus filhos na fé pode estar construindo mais para a eternidade do que um teólogo publicando artigos. A questão não é desvalorizar nenhuma vocação, mas reorientar nosso foco. Portanto, nem tudo o que parece religioso é frutífero, e nem tudo que é frutífero parece religioso. O Espírito não pode ser engaiolado por tradições ou títulos. Precisamos aprender novamente a reconhecer a obra de Deus pelos frutos, não pelas aparências. E se os frutos estão ausentes, talvez não seja o sistema que precisa de reforma. Talvez sejamos nós que precisamos nos reconectar à Videira.
No fim da vida, a pergunta não será: quanto você fez? Mas sim: quanto você permaneceu? Quão profundo você estava enraizado? Quanto fruto você permitiu que a Videira produzisse através de você? Esta é a Palavra do Senhor para uma Igreja frequentemente tentada a fazer mais em vez de permanecer mais. É um chamado à vigilância para todo coração que está ativo, mas desconectado. E é um convite cheio de esperança: se permanecermos n’Ele, o fruto virá.
Oxalá ouvísseis hoje a sua VOZ: não fecheis os vossos corações! (Sl 95,7)
Shalom!
© Pe. Chinaka Justin Mbaeri, OSJ
Seminário Padre Pedro Magnone, São Paulo, Brasil.
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Você já rezou o seu terço hoje?